Noções gerais sobre o conservadorismo
Logo de início, a definição que Hoppe dá ao conservadorismo: conservador é alguém que normalmente apoia o status quo, uma pessoa que deseja conservar as leis, as regras, as regulações e os códigos morais e comportamentais que existem em um determinado ponto no tempo.
Em virtude de diferentes leis, regras e instituições políticas existirem em tempos diferentes e/ou em locais diferentes, aquilo que um conservador apoia depende do lugar e do tempo, modificando-se de acordo. Ser um conservador, assim, denota nada de específico, exceto gostar da ordem existente, qualquer que seja ela.
Conservador é aquele que acredita que existe uma ordem natural anterior às anomalias existentes na sociedade. É aquele que acredita na existência de uma ordem natural, uma ordem que corresponde a natureza das coisas. O natural é aquilo que é duradouro e podemos ver ao longo dos séculos. Somente anomalias sofrem mudanças. O estado, por exemplo, já mudou tanto que não se pode ter uma única classificação do que é. O conservador é aquele que consegue perceber os “ruídos” que essas anomalias fazem.
A família, as comunidades familiares e a propriedade privada, são as instituições mais duradouras, antigas e indispensáveis sociedade. Uma autoridade familiar deve ser a autoridade daquela propriedade privada. A autoridade exercida em uma família provavelmente transcenderá sob um grupo de famílias, que se expandirá para outras famílias.
Existe a autoridade da hierarquia que transpassa de autoridades familiares para cavaleiros, duques, papas, reis; a segunda via é a espiritual, de Deus transcendental e dono da ordem natural que inicia a transcendência da ordem. O conservador, portanto, é o que defende a ordem e é contra a anomalia e a desordem social.
Erros do conservadorismo
Agora o autor fala um pouco sobre o neoconservadorismo. O conservadorismo passou por diversas distorções, estas causadas principalmente pelo sistema representativo da democracia. O conservadorismo que era uma força ideológica anti-igualitarista, aristocrática e anti-estatista, passou a ser um movimento de estatista culturalmente conservadores: social-democratas.
Eles estão preocupados com o divórcio, o multiculturalismo, criminalidade, etc. Eles devem ser contra isso, mas precisam de medidas radicais para essa mudança; precisam de mudanças profundas dentro do movimento. Eles não estão realmente preocupados com essas questões, mas usam dessas pautas para promover políticas contrárias ao que defendem.
Assistencialismo
A prática de medidas de bem estar social é a seguinte: na intensão (sejamos otimistas) de melhorar a qualidade de vida de pessoas, retiram dinheiro dos possuidores de riqueza para dar aos não possuidores. Com isso, menos dinheiro os empresários terão para ofertar mais empregos. Na intensão de subsidiar mães solteiras, mais incentivos a ser mãe solteira (ou desincentivo a arrumar um bom marido/pai) as mulheres terão e, por conseguinte, a sociedade estará no caminho da miséria.
Qualquer sistema assistencialista diminui os incentivos da responsabilidade própria, da educação, da benevolência, da autopreservação, em suma, da civilização. Os incentivos a ser alguém honrado, saudável, responsável econômico e socialmente diminui. Mises ressalta:
Estar doente não é um fenômeno independente da vontade consciente. (…) A eficiência do homem não é apenas um efeito da sua condição física; ela depende, em grande medida, da sua mente e da sua vontade. (…) O aspecto destruidor do sistema público de seguro contra acidentes e doenças encontra-se, acima de tudo, no fato de que tais instituições promovem os acidentes e a doença, dificultam a recuperação e muitas vezes criam – ou, de qualquer forma, intensificam e prolongam – os distúrbios funcionais que acompanham a doença ou o acidente. (…)
Sentir-se saudável é muito diferente de ser saudável no sentido médico. (…) Ao enfraquecer ou destruir completamente a vontade de estar bem e de estar em condições para o trabalho, a previdência social cria a doença e a incapacidade para o trabalho; ela estimula o hábito de reclamar – o qual, por si mesmo, já é uma neurose –, bem como neuroses de outros tipos. (…) Como uma instituição social, ela torna o povo física e mentalmente doente – ou pelo menos ajuda as doenças a se multiplicarem, a aumentarem e a se intensificarem. (…)
Assim, a previdência social transformou a neurose do segurado em uma perigosa doença pública. Caso a instituição seja ampliada e desenvolvida, a doença se alastrará. Nenhuma reforma pode ser de alguma serventia. Nós simplesmente não podemos enfraquecer ou destruir a vontade de ser saudável sem produzir a doença.
Protecionismo
O protecionismo econômico, como de Eneias, que se dizia defensor da família, é uma contradição. Protecionismo econômico implica em tirar o livre comércio de pessoas que buscam menores preços ou maiores salários onde quer que seja e, forçadamente, obriga as pessoas a levarem sua mão de obra ou sua demanda por produtos para locais consequentemente com menores salários e maiores preços.
Levando a ideia de protecionismo econômico a cabo, teríamos todos com emprego já que ninguém iria comercializar. O pleno emprego se instauraria e mesmo que as pessoas trabalhassem o dia todo, estariam presos na miséria absoluta.
Se Adam Smith diz que a sociedade só saiu da barbárie graças – não só – a venda do excedente de sua produção, temos que entender que isso não foi vontade de um governo ou de um intelectual, mas de algo natural do ser humano: trocar voluntariamente com outros indivíduos com diferentes qualidades a fim de obter benefício próprio.
Se essa é uma vontade intrínseca do ser humano, tanto socialistas ao querer planificar a economia quando ditos conservadores – defensores da família – ao defender o protecionismo econômico, falham. A ideia de ir contra as vontades naturais do ser humano com relação ao comércio não é conservadorismo, é “destrucionismo” econômico.
Educação pública
Os conservadores clássicos eram contra medidas assistencialismo e educação pública. Eles sabiam os males disso. Sabiam que a educação pública colocaria os jovens contra a autoridade das famílias e das comunidades familiares. Com a educação pública, além de não ser nada eficiente em termos educacionais (como tudo que o estado faz), poderia deixar os jovens mais favoráveis aos ideais do governo e menos aos dos pais conservadores.
As medidas assistencialistas deixariam as pessoas mais pobres, menos responsáveis e, claro, cada vez mais propícias a aceitarem os confortos imediatos do governo. De qualquer forma, os conservadores sabiam que medidas assistencialistas e educacionais acabariam com as famílias.
Se conservadores realmente defendem a família, devem se opor ao estado. Eles devem ser contra assistencialismo social, seguro desemprego, educação pública, e tudo mais que destrói a família. Os conservadores, portanto, precisam ser libertários de linha dura. Não possível, sem contradições, ser a favor da família e apoiar a instituição que mais destrói os laços familiares: o estado.
Conservadorismo libertário
Conservadores devem ser libertários de linha dura e, portanto, aprender o os libertários. Mas o que os libertários têm de aprender com os conservadores? Primeiro vamos definir o que é libertarianismo como estamos usando aqui. Hoppe mostra:
“O termo “libertarianismo”, como empregado aqui, é um fenômeno do século XX – ou, mais precisamente, um fenômeno pós-Segunda Guerra Mundial – que possui raízes intelectuais tanto no liberalismo clássico (dos séculos XVIII e XIX) quanto na filosofia do direito natural (a qual é ainda mais antiga). Trata-se de um produto do racionalismo moderno (iluminismo). Culminando na obra de Murray N. Rothbard, a qual é o nascedouro do movimento libertário moderno (em especial, a sua ética da liberdade), o libertarianismo é um sistema racional de ética (de direito).
Trabalhando dentro da tradição da filosofia política clássica – de Hobbes, Grotius, Pufendorf, Locke e Spencer – e empregando o mesmo antigo aparato lógico e as mesmas antigas ferramentas analíticas (conceituais), o libertarianismo (o rothbardianismo) é um código legal (jurídico) sistemático, obtido por meio da dedução lógica de um único princípio, cuja validade (e é isso que faz com que ele seja um princípio – i.e., um axioma ético – e com que o código legal libertário seja uma teoria da justiça axiomático-dedutiva) não pode ser contestada sem que se caia em contradições lógicas/práticas (praxeológicas) ou performativas (i.e., sem que se afirme implicitamente o que se nega explicitamente).
A partir do princípio da apropriação original – o princípio de que “o primeiro usuário é o primeiro proprietário” –, decorrem regras relativas à transformação e à transferência (troca) de recursos originalmente apropriados; e toda a ética (direito), incluindo os princípios da punição, é então reconstruída nos termos de uma teoria dos direitos de propriedade: todos os direitos humanos são direitos de propriedade, e todas as violações de direitos humanos são violações de direitos de propriedade. O resultado dessa teoria libertária da justiça é bem conhecido nesses círculos: o estado, conforme a vertente mais influente da teoria libertária (a vertente rothbardiana), é uma organização fora-da- -lei (criminosa), e a única ordem social justa é um sistema de anarquia de propriedade privada.”
No entanto, mesmo que os conservadores queiram defender a família, a única forma de o fazer é acabando, a princípio, com o estado de bem estar social. A ideia de apropriação original se aplica tanto aos libertários quanto aos conservadores, no sentido de que a família é constituída por seus participantes e dela mesmo tem de sair as hierarquias e governanças. Quando um governo impõe leis sobre as famílias, ele está lesando a apropriação original defendida pelos libertários.
Libertarianismo conservador
Aqui está o tópico mais polêmico da obra de Hans Hermann Hoppe, e que gera discussões tanto entre os libertários quanto com não libertários.
Discriminação
Assim como parece quase impossível a junção de socialistas com conservadores, o multiculturalismo dos libertários de esquerda é um problema. Libertários devem ser conservadores para a manutenção da discriminação. Quando um libertário diz que defende a propriedade privada, necessariamente está dizendo que defende que ele pode aceitar ou negar a presença de alguém em sua propriedade.
Com o estado, ou não, libertários de esquerda, defensores do multiculturalismo, incentivam que pessoas de diversas culturas possam ir e vir onde quiserem, fazer o que quiserem e tornar crime discriminar essas pessoas. Quando se defende a propriedade privada, não se pode nivelar pessoas e dizer que todas são bem vindas.
Acreditamos que pessoas com tendências criminosas (no sentido de alguém que rouba, mata, lesa, etc.) não são bem vindas em lugar algum. Se dizer isso, parece tranquilo você pensar que podemos expulsar essa pessoa, se preciso com uso de força.
Prática
Agora imagine que uma determinada cultura não aceita gays, negros, judeus, índios, etc.; outra não aceita brancos, héteros, mulheres e pessoas que domesticam animais exóticos como cobras e aranhas. Essas pessoas também devem ter o direito de não aceitar a presença dessas pessoas?
Essa relativização traz o problema da integração forçada. O estado, como já falamos, faz isso torto e a direito, mas mesmo os que se dizem libertários, sendo de esquerda e multiculturalistas, acabam falhando na defesa da propriedade privada. Se o governo impõe a integração forçada e lesa a defesa da minha propriedade, que diabo de libertários são esses que fazem exatamente a mesma coisa?
O dono de seu corpo e de suas propriedades deve ter o direito de discriminação e de expulsar quem quiser. Qualquer pessoa pode não querer exatamente ninguém na própria casa sem qualquer critério. Se for a família dela , pode não querer um amigo maconheiro do meu filho. Se for numa comunidade – e nessa comunidade as opiniões provavelmente serão bem parecidas caso o direito de secessão seja evidente -, podem não querer que mendigos ou bêbados andem na rua.
Se uma pessoa tem más intensões e não consegue se manter na sociedade por só saber roubar e lesar outras pessoas, deve ser incentivado não permitir que ela entre. Na rua, os vizinhos também não vão permitir a entrada dela. As empresas não vão contratá-la e naturalmente ela será expulsa da sociedade.
Isso o autor fala por crimes como roubo, assassinato, etc. No entanto, mesmo que não cometam crimes, pessoas devem ser expulsas fisicamente da sociedade caso não estejam de acordo com as leis daquele local. Se não aceitam brancos ou negros, gays ou héteros, se essa pessoa se enquadrar nesses quesitos que as pessoas não aceitam, devem, sim, ser expulsas.
Essas pessoas que serão expulsas formarão outro lugar para viver, talvez, e nesse lugar que se faça regras compatíveis. Nesse caso, você manteve as pessoas da primeira sociedade livres de integrações forçadas e a paz se estabeleceu.
Se quiserem fazer outra comunidade com pessoas brancas ou pretas, gays ou héteros, que se faça, mas dê o direito de defesa da propriedade delas. A discriminação não é a permissão de bater em mulheres, homens, gays, héteros, brancos ou pretos na rua, mas o direito de poder expulsar da propriedade quem não segue as leis morais ou éticas vigentes ali.
Se sexo sem consentimento é estupro, por que então alguém que eu não é consentida numa propriedade pode fazer o que quiser e ninguém pode fazer nada?
Conclusão
Como disse, o capítulo é polêmico, e as opniões do autor Hans Hermann Hoppe são fortes. No entanto, parecem fazer sentido para alguns grupos. O que Hoppe quer é que as pessoas vivam e façam o que quiserem, contato que respeitem a propriedade privada alheia.
Espero que tenha gostado. Te vejo no próximo capítulo.